"Voltando-se Jesus e vendo que o seguiam, perguntou-lhes: “Que procurais?”. "
Leia aqui a passagem bíblica correspondente (Jo 1, 35-51)
Neste trechinho do Evangelho de São João - uma das mais belas passagens, por sinal - São João Batista aponta para Jesus, o "Cordeiro de Deus". Sempre que ouço essas palavras na missa, me emociono, pois fico imaginando a cena, do brilho no olhar de São João ao avistar o Mestre e na alegria de poder anunciá-lo, fazê-lo conhecido por aqueles que o buscam. Essa convicção de São João Batista certamente nasceu de seu encontro pessoal com o Senhor. Este anúncio despertou o interesse e a curiosidade dos discípulos, que logo se colocaram a caminho. Ansiosos e com o coração sedento, seguem o Mestre em silêncio, certamente um pouco perdidos no meio daquela grande multidão que ia pelo caminho. O Senhor, que tudo percebe e a tudo está atento, viu os recém-chegados e se dirige a eles, para que se inicie o encontro:
"Que procurais?"
Os discípulos devem ter ficado espantados com a abordagem de Jesus, e prontamente responderam com outra pergunta:
"Mestre, onde moras?"
E o verdadeiro encontro ia começar: a busca e a disposição dos discípulos encontram a disponibilidade do Senhor, e seu convite"
"Vinde e vede!"
E passam com o Senhor todo aquele dia, usufruindo de sua presença, de suas palavras. Ouviram de João o anúncio e foram viver sua própria experiência de estar na presença de Jesus, conviver com ele intimamente, mergulhar em seu Mistério, saboreá-lo. Muitos que viveram naquela época também ouviram o anúncio do Batista, mas perderam-se pelos caminhos, não buscaram o Mestre, não gozaram de sua intimidade. Fico triste ao pensar na nossa situação hoje em dia nesse mundo tão globalizado, tão virtual, onde as coisas e as mensagens se tornam tão passageiras, tão descartáveis, e corremos o risco de viver na superficialidade do conhecimento de Jesus.
Creio que aqueles homens, diante da pergunta de Jesus ("O que procurais?") ficaram com a alma inquieta, pois confrontaram aquele vazio no peito, aquela sede que não se aplaca no coração. Como nós!!! Somos como aqueles discípulos, buscando ter esse encontro com Deus, essa intimidade que nos renova! Queremos estar com Jesus, permanecer com Ele, experimentar o Senhor! Que momento devem ter vivido aqueles homens... um encontro tão maravilhoso que marcou suas vidas para sempre. E não se contiveram em si! André logo foi a procura de seu irmão Pedro, e tanto fez que o levou para Jesus. É isso que acontece quando encontramos o Senhor... não nos limitamos dentro de nós mesmos - transbordamos para outra pessoa!
E Pedro? Como deve ter se ficado ao sentir sobre si os olhos profundos do Senhor, desnudando sua alma, falando a ele com aquela voz ao mesmo tempo firme e doce... Jesus é capaz de despertar aquilo que está presente dentro do coração de todo ser humano - às vezes adormecido - o desejo de Deus.
"O desejo de Deus está inscrito no coração do homem, já que o homem é criado por Deus e para Deus.” (CIC, nº 27).
Também Santo Agostinho, nas “Confissões”, fala a este respeito:
“Tarde te amei, Beleza tão antiga e tão nova, tarde te amei! Tu estavas dentro de mim e eu te buscava fora de mim...”
(X, 27,38).
E Felipe, ouvindo do Senhor aquele convite: "Segue-me!" sentiu-se escolhido pelo Senhor que sabe como enxergar você no meio de uma multidão, pois para Ele você é único, e faz questão de que você saiba que foi Ele quem te escolheu, Ele quem te chamou... E Felipe faz seu anúncio a Natanael: "Achamos aquele que os profetas anunciaram!"... Cético a princípio, Natanael decide ouvir o testemunho de Felipe e vai até Jesus. É mais um a se sentir único, escolhido pelo Mestre, que já o tinha "visto" antes de ser chamado. Jesus conhecia o coração de Natanael, sabia que ele buscava a Deus com um coração sedento.
E assim foi que esses homens todos tiveram suas vidas atingidas por algo muito profundo. Sentiram-se envolvidos pelo olhar de Jesus, por seu chamado. Ainda hoje Jesus segue com seu chamado. Muitos são chamados mas poucos respondem. Os homens hoje também continuam buscando, procurando, mas quase sempre em lugares e pessoas erradas, daí o vazio e a desilusão que muitos sentem.
A pergunta que Jesus faz aos discípulos, ele a faz também a todos aqueles que o buscam, que leem e ouvem o evangelho. Esta é uma pergunta existencial e por isso, essencial para a caminhada da fé. Esta pergunta se dirige àqueles que estão sempre em busca, inquietos e se interrogando sobre o essencial. Todas as pessoas estão sempre em busca de algo mais, por esse motivo, sempre insatisfeitas. Consciente ou inconscientemente, somos todos garimpeiros à procura do diamante da felicidade, andarilhos a procura da pedra preciosa, pela qual estamos dispostos a vender, com alegria, tudo o que possuímos (Barreiro, p. 57).
Que nós, no meio de tantas informações nesse mundo tão digitalizado, cheio de tantos "influencers" digitais, não percamos o nosso foco, que deve ser a busca por Deus, a intimidade com o Senhor... pois estar com Aquele que nos conhece e que nos chama não tem comparação com nada do que esse mundo possa nos oferecer. Ele nos chama porque sabe que o procuramos. Conhece nossos desejos e buscas. Toca fundo no nosso coração, despertando o desejo de Deus que está em todo ser humano, as vezes tão adormecido que nem nos damos conta.